É tarde eu já vou indo...

A porta estará sempre aberta. Caberá a você ousar entrar, espiar, invadir e decidir descobrir o que tem do lado de dentro.
Não posso ser responsável pelas suas impressões, elas serão simplesmente suas.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Madrigal

Desenho: Autor desconhecido

Quando me atirei ao mundo em busca da modernidade pensava não seres lugar para mim. Parti.
Eras ainda menina, curiosa, altiva, já mostravas a tua fidalguia. De tudo querias saber e trazer para si. O novo era o teu fascínio. Dizias - um dia serei vista pelo mundo inteiro - e não é que o mundo veio vê-la!
Passado muitos anos, as lembranças me viam. Lembranças de prosas em praças; dos passeios no Parque Trianon, das tardes de confeitaria e cumprimentos cerimoniosos.
Notícias chegavam de ti. Tu te tornaste tão alta que foras avistada além dos Oceanos. Correu tua fama no estrangeiro. Não mais resisti. Vim ver-te de perto.
Agora és ligeira. Teus braços longos conduzem a pressa que atravessa, sem medo, as tuas entranhas. Teus membros se expandiram. Fez de teus seios ama-de-leite de todos os homens, filhos de muitos pais.
Encontrei-a na plenitude de tua madureza e vi que, com sabedoria, aninha, em teu colo, muitos Pedros, Marinalvas e tantos outros forasteiros Acalenta-lhes os sonhos, doa-lhes o alimento farto. Abrigas a todos em teus muitos labirintos.
Soberba ainda, senhora de muitas histórias. Imponente, misteriosa, eleva-te ao cume, grandes construções. Derrama o progresso. Mete medo, tão complexa urbanidade. Instiga-me a uma aventura.
Percorro tuas avenidas, outrora quintais de jogos de menino. Já nem sei mais de teus caminhos.
Subo e desço elevados. Sequer sei o roteiro que dantes tinha como mapa de meu tesouro. Perco-me nos teus esconderijos. Confunde-me tanto letreiro. Não acho o vizinho da casa ao lado. Pareces-me tão estranha. Ainda assim, reconheço-te em mim.
E quando do alto do Chá me acho, sob a garoa da noite de julho, limpo os olhos do cansaço. Dou um chute no tempo. Quebro o meu silêncio. Abro o peito e rasgo o grito: que me importa se já não cheiras a Jasmim! Que me importa o teu mar de concreto! Abriga-me, São Paulo, em ti. Eis de volta o teu Curumim!

São Paulo - 2005 texto sem revisão gramatical

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